QUEM PODE FIGURAR COMO LOCADOR NOS CONTRATOS DE LOCAÇÃO?
Para responder essa pergunta, precisamos inicialmente lembrar que a locação, como negócio jurídico, é configurada pela transferência temporária da posse sobre um determinado bem, mediante a contraprestação correspondente, ou seja, o aluguel.
É importante salientar que nem a atual legislação especial 8.245/91, nem a lei revogada de 1979, definem a figura do locador, deixando a matéria no âmbito civil. Apenas para comparação, lembramos que o Estatuto de Defesa do Consumidor em seus arts. 2º e 3º definem exatamente as figuras de consumidor e fornecedor para efeitos daquela lei.
A princípio, a pergunta pode não aparentar maior relevância, porém, na prática a resposta mostrará que a depender de quem figura como locador, os efeitos do contrato podem ser diferentes para ambos os contratantes. Um ponto que deve ser analisado pelas administradoras e imobiliárias como prevenção de litígios e responsabilização, mas isso deixaremos para um futuro texto.
No âmbito imobiliário temos a propriedade imobiliária que, na forma plena, garante ao seu titular o direito de usar, gozar, dispor da coisa e de reavê-la de quem injustamente a possua ou detenha.
Nem sempre a posse do imóvel é derivada da propriedade, lembrando que o atual Código Civil adotou a teoria objetiva de Ihering, pela qual a posse enquanto situação de fato, é o exercício de alguns poderes inerentes à propriedade, poderes esses citados no parágrafo anterior.
Portanto, precisamos distinguir os direitos pessoais dos direitos reais, sendo este último um direito sobre o bem e instituído por lei, dentre os quais estão a propriedade, o uso, a habitação, o usufruto e mais recentemente a concessão do direito real de uso.
O contrato de locação não transfere direitos reais mas, de natureza pessoal e obrigacional, transfere a posse direta e de forma temporária sobre o imóvel.
Começando a responder a pergunta que intitula o presente texto, apontamos que a lei 8.245/91 não exige que o locador seja o proprietário do bem, apenas garante direitos com a condição da propriedade e que só o registro imobiliária poderá atingir. Frisamos, a coincidência entre locador e proprietário gera efeitos contratuais além daqueles quando essa combinação não existe.
Conforme citamos a adoção pelo legislador civil da teoria objetiva da posse, o código civil em seu art. 1214, garante ao possuidor de boa-fé, o direito de fruir o bem, vejamos:
Art. 1.214. O possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela durar, aos frutos percebidos.
Por fruição temos o direito de aproveitar e de se apropriar dos frutos, sejam naturais ou civis como no caso da locação. O aluguel é um fruto civil sobre a coisa.
O direito à fruição também é da natureza do direito real de usufruto, um direito real sobre coisa alheia, garantindo ao usufrutuário o uso e apropriação dos frutos provenientes do bem, destacando-o dos poderes da propriedade.
Art. 1.394. O usufrutuário tem direito à posse, uso, administração e percepção dos frutos.
Art. 1.399. O usufrutuário pode usufruir em pessoa, ou mediante arrendamento, o prédio, mas não mudar-lhe a destinação econômica, sem expressa autorização do proprietário. (grifamos)
Sendo um direito real sobre coisa alheia, o usufrutuário é um possuidor direto do bem, portanto, legitimado à destinar a posse em locação e figurar como locador nas relações locatícias.
Até aqui acreditamos que respondemos a pergunta inicial e chegamos à conclusão que tanto o proprietário como o possuidor direto e de boa -fé sobre o imóvel, podem figurar como locadores para fins de locação imobiliária, exercendo e respondendo de forma obrigacional em âmbito de direito pessoal.
Para as imobiliárias, administradoras e inquilinos, é importante a atenção sobre a forma em que a posse é exercida sobre o imóvel destinado à locação, principalmente que seja uma posse de boa-fé, ainda que não atrelada a um justo título.
No próximo texto abordaremos a diferença de efeitos quando o locador é apenas um possuidor direto ou quando é realmente o proprietário tabular sobre o imóvel.
Luis Fábio Mandina Pereira.
Advogado especialista em Direito Imobiliário com Ênfase em Direito Notarial e Registral.